Salles tenta driblar metas ambientais, mas recua

Ministério do Meio Ambiente é criticado internacionalmente por medidas que não ajudam na prevenção ao desmatamento

A imagem mostra o presidente Jair Bolsonaro e o Ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles. Ricardo está falando alguma coisa no ouvido de Bolsonaro. O presidente está com um sorriso de canto. Os dois homens usam terno e gravata.
O presidente Bolsonaro e o ministro Salles se envolvem em mais uma polêmica. Foto: Nelson Almeida/Getty Images


Por Laís David de Souza
O Ministério do Meio Ambiente (MMA) do governo de Jair Bolsonaro, liderado pelo advogado Ricardo Salles, se envolveu em dezenas de escândalos com a comunidade ambiental nos últimos meses. Na semana de 4 de agosto de 2020, Salles foi extremamente criticado ao tentar interferir nas metas ambientais do Plano Plurianual de 2020.

O Plano Plurianual (PPA), regulamentado na Constituição de 1988, é um aparato legislativo de planejamento governamental. Nele, as principais prioridades, metas e diretrizes orçamentárias de um governo são definidas, e assim, o Estado pode executar suas funções corretamente.
A causa ambiental também possui seu espaço: o Plano Plurianual do governo de Jair Bolsonaro reserva dois artigos visando a melhoria da qualidade ambiental, e traça como meta para até o ano de 2023 ‘reduzir o desmatamento e os incêndios ilegais nos biomas em 90%’.
Entretanto, no dia 3 de agosto, o jornal O Estado de São Paulo divulgou que Salles propôs a descontinuação da meta de prevenção de desmatamento original. Numa tentativa de driblar o plano estabelecido, Salles defendeu a preservação de uma cota específica de vegetação: apenas 390 mil hectares da Amazônia seriam salvos até 2023.
A imagem mostra o ministro do meio ambiente Ricardo Salles com uma cara que aparenta preocupação. O fundo está com o símbolo da República desfocado.
A proposta foi rapidamente rejeitada. Foto: Agência O Globo/Jorge William


O valor defendido pelo ministro do Meio Ambiente não é nada expressivo, considerando que 390 mil hectares é uma fração mínima do território do bioma. O Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) afirma que o desmatamento no ano de 2019 chegou a atingir 1 milhão de hectares.
Na mesma semana da mudança, foi divulgado que o Ministério da Economia (ME) discordou da pauta e influenciou a desistência de Salles. Em nota, o ministério dirigido por Paulo Guedes afirmou que “a proposta inicial de alteração da meta apresentada pelo Ministério do Meio Ambiente precisou ser ajustada para se adequar aos critérios legais, o que foi feito pelo MMA ao propor uma nova redação para análise do Ministério da Economia”.

As políticas ambientais do governo de Jair Bolsonaro são amplamente criticadas por pesquisadores da área e ambientalistas. Em menos de dois anos de governo, a gestão bolsonarista tece a desestruturação de órgãos, como o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) e o próprio INPE, além da flexibilização das leis ambientais e de agrotóxicos.
Dados confirmam o aumento considerável de desmatamento dentro dos biomas brasileiros – o desmatamento dentro da Amazônia Legal, região que engloba os seguintes estados Amazonas, Roraima, Rondônia, Pará, Amapá, Acre, Tocantins, Mato Grosso e Maranhão, aumentou cerca de 51% no período de um ano, e as queimadas chegaram a um aumento de 82% em seis meses, segundo o INPE. 

A imagem mostra um gráfico que exibe o índice de desmatamento na Amazônia Legal nos últimos onze anos. Em 2008, foi desmatado 13.300 km². Em 2009 e 2010 foi desmatado 6.300 km². Em 2011 desmatado 5.700 km². Em 2012, foi desmatado 4.400 km². Em 2013, foi desmatado 5.400 km². Em 2014 foi desmatado 5.100 km². Em 2015, foi desmatado 6.100 km². Em 2016, foi desmatado 7.200 km². Em 2017, foi desmatado 7.000 km². Em 2018, foi desmatado 7.200 km². E em 2019, foi desmatado 10.900 km².
Número em quilômetros quadrados das áreas desmatadas na Amazônia Legal. Imagem: Terra Brasilis/INPE
Em entrevista ao Impacto Ambiental, Ricardo Galvão, ex-diretor do INPE e professor da Universidade de São Paulo (USP), aponta que o governo atual não está fazendo o necessário para a preservação da Amazônia. “Aqui se trata não apenas de incompetência, mas principalmente de uma disposição inicial do Governo de não atuar para coibir não somente o desmatamento, mas outras ações de preservação do meio ambiente em geral’’, diz o professor.

Os escândalos em torno da Amazônia viraram assunto fora do Brasil . Em 1995, o então presidente do Brasil Fernando Henrique Cardoso criou o Conselho da Amazônia, com o objetivo de coordenar ações de política nacional no bioma com a integração dos ministérios do governo. Apesar dele ter sido formulado, nunca foi realmente utilizado, até que em 2020 o presidente Bolsonaro reativou o Conselho.

A imagem mostra um print do twitter do presidente Jair Bolsonaro. O tweet diz o seguinte Determinei a criação do Conselho da Amazônia, a ser coordenado pelo Vice Presidente @GeneralMourão, utilizando sua própria estrutura, e que terá por objetivo coordenar as diversas ações em cada ministério voltadas para a proteção, defesa e desenvolvimento sustentável da Amazônia.
Conselho da Amazônia restituído. Imagem: Twitter oficial de Jair Bolsonaro


O Conselho é uma das tentativas estatais de um discurso mais verde. A política ambiental de Bolsonaro é criticada não apenas por opositores, mas também por investidores internacionais, que, segundo o vice-presidente Hamilton Mourão em coletiva, “querem ver resultados” das medidas de preservação. 
Ricardo Galvão complementa:

a reação nacional e internacional à política do Governo têm forçado a mudar seu discurso e apresentar algumas medidas de controle do desmatamento e queimadas na Amazônia.

A imagem mostra uma foto aérea da floresta Amazônica e sua devastação. Na imagem é visível ver grande parte da floresta queimada e derrubada.
Destruição da Floresta Amazônica. Foto: Victor R. Caivano/Associated Press

O interesse do Estado em proteger a Floresta Amazônica é, majoritariamente, devido à pressão internacional. Outros biomas tão importantes e diversos quanto a Amazônia sofrem com queimadas e desmatamentos sem tanta atenção da mídia ou do governo, como é o caso do pantanal (a maior planície alagada do mundo) ou do cerrado. Ainda de acordo com o INPE, o pantanal sofreu 1684 focos de incêndio apenas no mês de julho – uma tragédia ambiental desamparada, segundo especialistas.

A crise ambiental dos últimos meses salienta a importância dos ecossistemas brasileiros. A Iniciativa de Finanças para a Biodiversidade (BIOFIN) categoriza o Brasil como o país mais biodiverso do planeta. Ameaçados pela ação antrópica, os biomas brasileiros, como a Floresta Amazônica e o Pantanal, são vitais para o equilíbrio ambiental da América Latina e do mundo.
Edição: Maria Eduarda Vieira

 

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