A exploração sem regulamentação dos recursos naturais e do conhecimento popular gera problemas
(Foto: Agência de Notícias do Acre) |
A Biopirataria é a exploração, apropriação e exportação de recursos nativos de um país para o mercado externo, a fins comerciais e sem consentimento. Não se limita apenas a animais ou plantas, mas se estende ao próprio conhecimento, passado através de gerações pelos povos que habitam tal país.
O valor da biodiversidade
Segundo Ivanira Pancheri, advogada especializada em Direito Ambiental e Biodireito, o Brasil é uma nação que possui uma vasta biodiversidade e rica sociobiodiversidade. Esta, engloba o conhecimento popular de suas comunidades tradicionais.
“As comunidades tradicionais brasileiras são compostas por cerca de 700 terras indígenas, que correspondem a mais de 12% do território nacional e aproximadamente 340 mil índios, distribuídos entre 220 tribos e mais de 70 grupos isolados sem outros informes, e por diversas comunidades – como quilombolas, caiçaras e seringueiros. Essas comunidades reúnem inestimável acervo de conhecimentos tradicionais sobre a conservação da Biodiversidade”, explica Pancheri.
Toda a informação que se obtém através do patrimônio genético ou da cultura popular possui um valor de mercado. Esses conhecimentos transformam-se em commodities, pois adquirem grande importância econômica. Por isso, precisam de proteção, já que empresas multinacionais que exploram esses recursos fazem a patente de todo o conhecimento explorado e, assim, os lucros gerados não são repartidos de forma justa para o Estado ou para as comunidades tradicionais.
O processo de isolamento do produto ativo ou do material genético é muito comum em países com grande biodiversidade. Com o avanço da biotecnologia, essa prática se tornou mais fácil e vantajosa, levando em conta a facilidade do transporte do material genético. Assim, é necessária uma regulamentação correta para esse tipo de infração.
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Um crime sem regulamentação
A regulamentação da biopirataria no Brasil é algo incompleto. Algumas leis foram feitas para tratar sobre o tema, porém nenhuma delas o contempla em sua totalidade.
Atualmente, o Projeto de Lei 7735/2014 tenta realizar esse papel, dispondo sobre o acesso ao patrimônio genético, sobre a proteção e o acesso ao conhecimento tradicional associado e sobre a repartição de benefícios para conservação e uso sustentável da biodiversidade. Porém, foi realizado sem a participação de pequenos agricultores, camponeses e comunidades tradicionais, que são alvos mais frágeis e importantes do processo, o que acaba por contestar parte de sua legitimidade.
Os povos indígenas, por exemplo, sofrem constantemente com a desregulamentação, pois muitas empresas estrangeiras tentam monopolizar e comercializar o conhecimento que eles adquiriram através das gerações. Essa acaba por ser uma questão muito séria, que não envolve só o financeiro, como também mexe com a identidade de um povo.
Ainda de acordo com Pancheri, “o marco legal da biodiversidade privilegiou as empresas e ampliou o acesso à biodiversidade sem proteger os povos indígenas (como também outras comunidades) e seus conhecimentos tradicionais”.
(Foto: Roberto Linsker) |
Marca Histórica
A Biopirataria é um conceito novo de uma prática que acontece há séculos, principalmente em um país com um histórico colonial. Muitos dos recursos naturais do Brasil foram exportados e comercializados. O pau-brasil e a própria seringueira são um bom exemplo.
Segundo o livro O Ladrão No Fim do Mundo, de Joe Jackson, o inglês Henry Wickham contrabandeou do Brasil, em 1876, 70 mil sementes de seringueiras que, após um processo de seleção genética, foram distribuídas para países tropicais. Décadas depois, a Malásia tornou-se o maior exportador de látex, deixando o Brasil em prejuízo econômico.
Desse modo, é muito importante que uma legislação mais rigorosa seja feita no país. Paiva afirma que, além da perda da Bioversidade e do patrimônio genético, a biopirataria traz prejuízos financeiros inestimáveis, e a patente utilizada nos produtos impede que o conhecimento gerado através de gerações seja utilizado pelas próprias comunidades que o desenvolveram.