Bauru registra problemas no sistema de abastecimento de água

Moradores dos bairros que realizam a captação da bacia do Rio Batalha são os mais afetados pelo racionamento

Por Ana Luiza Otrente Batista

A água chega durante a madrugada. Evanir Vieira Amorim, também conhecida como Dona Branca, consegue escutar os sons que vêm do encanamento e que confirmam o abastecimento da caixa d’água. Moradora do Jardim Solange, em Bauru – SP, ela conta que, por meses, teve que lidar com a incerteza do racionamento na cidade.

“Tudo começou em agosto. Sofremos com duras faltas d’água, mas foi somente em setembro que se iniciou o rodízio. Precisávamos armazená-la em baldes, galões e tambores. Aos poucos foi melhorando, mas, aí, veio o colapso: do dia 09 ao dia 12 de novembro ficamos totalmente sem água, apareceu até nos noticiários. Foi difícil. Além de tudo, eu ganhei dores terríveis na coluna devido ao carregamento dos baldes”, relata Dona Branca.

A rotina não foi muito diferente para Vera Gimenes, residente do Parque Real, que também sofreu com o racionamento. “Aqui onde moro já chegamos a ficar até quatro dias consecutivos sem água. Tivemos que armazenar em tambores e pudemos pegar água de uma escola do bairro. Até que o DAE (Departamento de Água e Esgoto de Bauru) disse que resolveria o problema e, de fato, resolveu. Agora o bairro é abastecido por poços artesianos”, conta a moradora.

A explicação meteorológica para esses períodos de falta d’água e estiagem é a região na qual a cidade de Bauru faz parte: o Hemisfério Sul. Composto pelo continente africano, pela América do Sul e Oceania (principalmente a Austrália), ele passa por uma tendência de resfriamento.

De acordo com Augusto Jose Pereira Filho, docente do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas (IAG), da Universidade de São Paulo (USP), “essa seca está associada também com as temperaturas dos oceanos abaixo do normal e próximas do recorde de área de gelo oceânico no entorno do continente Antártica. Além disso, as chuvas estão abaixo da média histórica da Amazônia até o Sul do Brasil. E é neste contexto que se insere o estado de São Paulo e a Bacia do Tietê, da qual o Rio Batalha faz parte”.

A imagem mostra um mapa global de anomalias de chuva. Ele mostra o contorno dos continentes e a quantidade de chuva ao longo dos anos de 1981 a 2010. Se chove mais a cor é verde e se chove menos a cor é roxa. No mapa se vê pontos da África, Austrália e a América do Sul em roxo, mostrando sua estiagem.
Mapa global de anomalias de chuva que mostra o Hemisfério Sul. No mapa se vê que a Austrália, parte da África e América do Sul são regiões atingidas pela estiagem. Mapa: Augusto Jose Pereira Filho

Para que o Rio Batalha consiga atender as demandas de captação e abastecimento da cidade, é preciso que ele atinja um certo volume hídrico, e isso é possível por meio do acúmulo de água da chuva. Pereira Filho explica que, no Brasil, a água da chuva vem do Oceano Atlântico por meio do transporte sazonal de vapor d’água, seguindo a rota de Leste para Oeste.

“A superfície aquecida do oceano evapora mais água, causando, também, ventos mais fortes sendo que o inverso faz com que diminua a evaporação de água oceânica e o transporte. A quantidade de vapor d’água na atmosfera é o que regula a temperatura do ar. Com mais vapor d’água, mais são as formações de nuvens e, consequentemente, de chuva”, pontua o meteorologista.

Os efeitos prolongados da seca, que vêm se intensificando ao longo dos anos, exigem medidas de precaução, como o monitoramento e prognóstico climático, que pode ser realizado com até seis meses de antecedência.

Conforme especifica o docente, “é dever dos gestores de recursos hídricos tomar decisões com base nestas informações, como, por exemplo, promover campanhas para redução do consumo de água”.

O tratamento de esgoto também pode ser uma opção viável para a revitalização do Rio Batalha, visto que, segundo o estudo realizado pelo Instituto Trata Brasil, Bauru trata menos de 2% do esgoto produzido.

Apesar de 70% da população do município ser abastecida por poços artesianos, os outros 30% captam a água que utilizam para se higienizar, em especial, neste período de pandemia, diretamente do Rio Batalha.

De acordo com Gustavo Henrique Ribeiro da Silva, coordenador do Programa em Engenharia Civil e Ambiental, da UNESP de Bauru, “a recuperação e conservação da nascente do Rio Batalha, a conscientização da população no gasto d’água e a melhoria nas redes de abastecimento quanto às perdas d’água” são alguns dos atos que podem ser realizados para evitar o racionamento na cidade.

A imagem mostra o desenho de casas no canto superior direito. Está escrito “Abastecimento de água da população de Bauru, abastecida pelo Rio Batalha é 30% e abastecida por poços artesianos é 70%. Os bairros são: Água do Sobrado (Parte), Jardim Aracy, Jardim Brasilia, Jardim Dalila, Jardim de Allah, Jardim Faria, Núcleo Habitacional Joaquim Guilherme de Oliveira, Parque Jandaia, Residencial Doutor Manoel Lopes, Residencial Parque das Andorinhas, Residencial Parque dos Sabiás, Residencial Quinta Ranieri, Residencial Spazio Verde Comendador,Residencial Villa Dumont,Vila Bela, Vila Dante Alighieri, Vila Falcão, Vila Giunta, Vila Industrial (próximo ao depósito da Receita Federal), Vila Martha, Vila Pacífico, Vila Pacífico 2, Vila Paraíso (Parte), Vila Pelegrina, Vila Santa Terezinha (Parte), Vila São Manoel, Vila Souto, Água do Sobrado (Parte), Jardim Ana Lúcia, Jardim Central, Jardim Esplanada, Jardim Eugenia, Jardim Ferraz, Jardim Gaivota, Jardim Jandira, Jardim Noroeste, Jardim Ouro Verde, Jardim Shangri-Lá, Jardim Solange, Jardim Terra Branca, Jardim Vitória, Parque Fortaleza, Parque São Joaquim, Residencial Parque Granja Cecília A, Residencial Parque Granja Cecília B, Vila Bernardino Prates, Vila Carvalho, Vila D'Aro, Vila Independência, Vila Ipiranga, Vila Maria, Vila Nipônica, Vila Nova Nipônica, Vila Nova Paulista, Vila Nova Santa Ignez, Vila Nove de Julho, Vila Paulista, Vila Popular, Vila Razuk, Vila Santa Ignez, Vila Santista, Vila São Francisco, Vila São João do Ipiranga, Vila Tentor, Condomínio Residencial Jardins do Sul, Jardim Celina (Parte), Jardim Jussara, Parque São João, Vila Alto Paraíso, Vila Industrial (próximo ao Hospital Manoel de Abreu), Vila Paraíso (Parte), Vila Rocha, Vila Santa Terezinha (Parte), Altos da Cidade, Centro, Jardim Avenida, Jardim Estoril, Jardim Estoril 2, Jardim Estoril 3, Jardim Pagani, Residencial Centreville, Vila Altinópoli, Vila América, Vila Antártica, Vila Ascenção, Vila Bonfim, Vila Cardia (entre Rodrigues Alves/Marcondes Salgado), Vila das Flores, Vila Ferraz, Vila Frutuoso Dias, Vila Gorizia, Vila Marinazan, Vila Mesquita, Vila Nise, Vila Noemy, Vila Nova Cidade Universitária, Vila Nova Nise, Vila Nova Santa Clara, Vila Perroca, Vila Pinto, Vila Régis, Vila Samaritana, Vila Santa Clara, Vila Santa Izabel, Vila Santa Tereza, Vila Vieira e Vila Zillo.
Lista dos bairros afetados pelo racionamento de água em Bauru. Informações: site do Departamento de Água e Esgoto de Bauru/Arte: Romulo Bin

Em entrevista ao Impacto Ambiental, o DAE afirmou que segue com ações para diminuir a área atendida pelo sistema de captação do Rio Batalha, a fim de reforçar a distribuição de água na cidade. Em 2021, pretende-se criar um novo poço na região da Praça Portugal, que compõe toda a área central.

Ainda segundo Gustavo da Silva, a água subterrânea é uma água de reserva, e, portanto, deve-se, sempre que possível, preservá-la. Ademais, a perfuração de poços artesianos visando atenuar o problema de falta d’água pode causar efeito contrário.

“Se começarmos a consumir essa água, e a reposição dela não for na mesma proporção, ficaremos com falta d’água também em nossa água de reserva. O interessante seria a captação superficial, ou seja, no rio. E quanto mais próxima da Estação de Tratamento de Água, melhor. Uma reforma ou construção mais moderna de uma estação, em Bauru, pode fazer a diferença”, complementa.

Além disso, o DAE declara que “o Plano Diretor de Água identificou a necessidade de execução de uma nova captação de água superficial que iria complementar a existente, na própria bacia do Batalha, com capacidade de produzir 350 litros por segundo (1.260 metros cúbicos por hora). A contratação desse projeto está andamento”.

Edição: Maria Eduarda Vieira
Revisão: Anna Araia, João Mateus Macruz e Maria Eduarda Vieira

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