Cruzamento industrial: a genética a favor da pecuária brasileira

Método de cruzamento utiliza a combinação genética para criar gado que obtém melhores resultados

rebanho de vacas pastando
Vacas da raça Nelore (Foto: Ana Luísa Agostinho)

Texto colaborativo*: Ana Luísa Agostinho

Quando se fala sobre agronegócio, a bovinocultura é um nome certo de produção bem-sucedida no Brasil. De acordo com o Ministério da Agricultura, o país é líder em exportação de carne no mundo desde 2008, além de ser dono do maior rebanho comercial, com mais de 214 milhões de cabeças de gado.

O cultivo de gado de corte é a área mais estimulada de produção. Dados divulgados em Junho de 2016 pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) mostram que só no primeiro trimestre desse ano foram abatidas 7,29 milhões de cabeças de bovinos. Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e São Paulo estão entre os estados mais produtivos do país.

Com tamanha importância para a economia, a bovinocultura recebe muito investimento em pesquisa e tecnologia para levar inovações e melhorias aos produtores. De equipamentos modernos a rações aprimoradas, tudo é desenvolvido para facilitar o processo de criação e melhorar a eficiência e qualidade da carne.

Melhoria genética como fórmula de sucesso

O cruzamento industrial tem se tornado uma prática muito comum nas fazendas para o aumento dos resultados. Esse método utiliza combinações genéticas para dar origem a animais com melhores características em relação às raças de origem.

O processo de acasalamento ocorre entre gados de raças diferentes  e pode ser realizado por inseminação artificial ou  a campo. Essa fecundação dá origem à heterose, fenômeno pelo qual os filhos apresentam um maior desempenho que seus pais. O “boi misto” obtém características desejadas, como adaptabilidade, peso adulto e resistência parasitária.

O cruzamento tem sido uma boa ferramenta para o aumento da produção e da qualidade da carne. Uma das maiores vantagens tem sido a resposta rápida e positiva em relação ao gado. Além de fazer com que ele ganhe o peso necessário mais cedo, também produz uma carne mais macia e com menos gordura. Produtor há cinco anos na cidade de Bofete, no interior paulista, João Pimentel descobriu o cruzamento recentemente e, em um ano, já percebeu resultados. “Eu consigo um animal bem mais pesado no mesmo período. Os animais ganham de 60 a 100 quilos a mais que o bezerro Nelore na desmama”, disse.

Para isso, a escolha das raças é um ponto crucial para o fazendeiro. Wagiu, Senepol, Nelore, Angus e Bahman são algumas das raças normalmente usadas no processo. Além do nível de compatibilidade, a adaptação ao local também deve ser considerada para trazer mais conforto aos animais e facilidade no método. No Brasil, o cruzamento entre o Nelore e o Angus é o que trouxe melhores resultados. Para o professor de Bovinocultura de Corte da Universidade Tecnológica Federal do Paraná, Luís Fernando Glasenapp, o desempenho desses animais pode chegar até 20% mais do que o boi puro.

boi pastando
Boi Senepol (Foto: Ana Luísa Agostinho)

O Angus tem sido muito explorado por ser um boi que possui precocidade sexual, fertilidade e um bom acabamento de carcaça. De origem britânica, começou a ser criado no Sul do país e hoje já responde bem a climas mais quentes. É um boi mais escuro e pode ser encontrado nas variações Aberdeen Angus e Red Angus. A carne possui maciez, suculência e marmoreio mesmo em partes menos nobres e é cada vez mais procurada pelo mercado.

De acordo com a Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carne, as raças zebuínas representam 80% do rebanho comercial do Brasil. O Nelore é largamente usado pela pecuária por ser bem acomodado no pasto, ter resistência a parasitas e boa aceitação em mudanças genéticas. Sua carne tem pouca camada de gordura e é muito consumida pelos brasileiros.

Mudanças e adaptações

Para o cruzamento acontecer é muito importante ter uma equipe de profissionais adequados, como veterinários e zoólogos, para acompanhar a evolução do animal. Diferentemente de uma cria normal, a atenção com o gado misto é redobrada e muitas vezes pode assustar o produtor na hora de investir nessa técnica.

Zootecnólogo formado pela Unesp Botucatu há oito anos e especialista em nutrição de ruminantes, Marcelo Sarti diz que uma das maiores dificuldades enfrentadas é a questão nutricional. “Um animal com maior potencial para ganho também tem uma maior exigência nutricional, sendo importante o atendimento destas para um melhor desempenho”, comentou.

O criador deve estar disposto a fazer mudanças, às vezes radicais, para se adaptar a um gado mais exigente. Lucca Baptistella, veterinário e produtor da fazenda Sobradinho em Paranapanema, São Paulo, acredita que se o produtor não estiver preparado para fornecer uma alimentação de qualidade, poderá não obter bons resultados. Apesar do uso intenso do pasto no Brasil, ele não fornece a quantidade adequada de nutrientes para o boi misto.

vaca próxima a uma cerca
Vaca Nelore (Foto: Ana Luísa Agostinho)

Além disso, o fazendeiro pode desembolsar uma grande quantia com outras necessidades, como conforto do animal, uso da inseminação artificial, grupo de funcionários especializados e até a compra de mais touros para fertilização. Com isso, o retorno tem sido considerável e começa em média dois anos a partir do início do processo.

O mercado consumidor tem ficado cada vez mais exigente e a melhoria genética tem atingido as expectativas. A crescente procura por carnes diferenciadas e gourmets atraiu a atenção das indústrias que têm investido muito em novas técnicas de produção, como o cruzamento. Luís Fernando também analisa o impacto para o agronegócio. “Nos últimos anos, a venda de sêmen de raças europeias ultrapassou a do Nelore. Além disso, vem crescendo o fomento de associações de raças, bonificando quem produz carne da raça desejada”, disse.

Um exemplo de sucesso e investimento no cruzamento industrial é o Programa de Fomento da Carne Angus em que frigoríficos, juntamente com a Associação de Criadores, bonificam carcaças de animais Angus e a cruza da raça.

A tecnologia e a pesquisa têm contribuído de forma próspera para a economia e o desenvolvimento do país. Novidades como o melhoramento genético chamam a atenção do fazendeiro convencional para uma nova valorização da pecuária. A bovinocultura é não só um setor de influência nacional mas também contribui para promover o reconhecimento do agronegócio brasileiro no mundo.

Texto colaborativo*: Ana Luísa Agostinho

*Por ser um projeto de extensão oficial da Unesp, o Impacto Ambiental está aberto a publicações ocasionais de matérias colaborativas de não membros do projeto. Nesses casos, a matéria e seu conteúdo não passam pelo processo comum de discussão e elaboração na equipe, ficando sob total responsabilidade do autor.

Leia também:
Cowspiracy: quem é culpado pelo aquecimento global?
O que é Racismo Ambiental e o que tem a ver com o uso inadequado do solo?
Monsanto: o monopólio de alimentos transgênicos

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *