Saiba o que são e descubra como elas protegem a biodiversidade
Por Ludmila Henrique e Luís Silva
Embora a conservação da biodiversidade seja um assunto considerado de suma importância há décadas por especialistas, foi ao longo dos últimos anos que os olhos de grande parte da população mundial se voltaram para o tema. O evidenciamento de um aquecimento global cada vez mais próximo da ebulição e da crise climática, provocada por chuvas intensas e ondas de calor como nunca antes vistas, tornou a conservação do meio ambiente, bem como assuntos voltados para o meio socioambientalista cada vez mais efervescentes.
As possibilidades de degradação, a nível nacional e mundial, são inúmeras. Poluição (da atmosfera, do solo, e de rios, mares e oceanos), desmatamento, queimadas… mas dentre estes assuntos, existe um que, em algumas ocasiões, pode até passar despercebido: a extinção de espécies da fauna e da flora. Historicamente, as atividades humanas têm acelerado a degradação de muitos ecossistemas e ocasionado a perda de habitats naturais, um dos fatores que contribui diretamente com o aumento da vulnerabilidade de diversas espécies e as coloca à beira da extinção, por exemplo.
O Brasil, lar de uma das maiores florestas do mundo, a Floresta Amazônica, e de uma riquíssima biodiversidade natural, possui milhares de espécies em risco de extinção. Segundo levantamento realizado em 2021 e disponibilizado pelo Portal de Dados Abertos do Ministério do Meio Ambiente, em território nacional, existiam, naquele ano, cerca de 4.619 espécies ameaçadas de extinção, divididas entre fauna e flora. Diante de uma realidade em que os números tendem só a aumentar, é necessário que iniciativas, em prol da manutenção da vida destas espécies, sejam tomadas.
Neste sentido, um dos organismos que têm como grande propósito a preservação da vida destes animais são as Unidades Ambientais, como zoológicos e jardins botânicos, que prestam um importante serviço na tentativa de frear os crescentes números de extinção. Longe de serem apenas espaços de entretenimento, essas instituições desempenham um papel crucial na conscientização, pesquisa e conservação.
Espécies em extinção
Das 4.619 espécies contabilizadas no levantamento do Ministério do Meio Ambiente, 3.212 são pertencentes à flora, enquanto as 1.407 restantes são espécies da fauna. Espécies como a Arara-Azul e o Mico-Leão Dourado, no caso da fauna, e o Pau-Brasil e a Copaíba, no caso da flora, estão entre as que correm maior risco. E para entender a causa de todo este problema, é necessário olhar para além das questões climáticas e de aquecimento global e, também, para os diversos crimes ambientais cometidos em solo brasileiro todos os anos.
O avanço do desmatamento, que pode ser relacionado à expansão agrícola e a exploração descontrolada da madeira, contribui para a degradação de habitats naturais, uma perda significativa. Além do desmatamento, queimadas, que em algumas ocasiões são provocadas de forma proposital, são ainda mais prejudiciais. Todo o estrago causado pelo fogo é capaz de devastar ecossistemas inteiros e deixar diversas espécies em risco de uma única vez.
Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza (SNUC)
Implantada no Brasil nos anos 2000, a Lei de Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza (SNUC) número 9.985, denominam as Unidades de Conservação (UC) como “espaços territoriais e seus recursos ambientais, incluindo as águas jurisdicionais, com características naturais relevantes, legalmente instituídos pelo Poder Público, com objetivos de conservação e limites definidos, sob regime especial de administração, ao qual se aplicam garantias adequadas de proteção de lei” (art. 1°, I).
As unidades de conservação têm como objetivo garantir a preservação da diversidade biológica e a proteção de áreas subordinadas pela Lei do SNUC. Além disso, as UCs também garantem o uso sustentável e racional dos recursos naturais às populações tradicionais e as comunidades que vivem próximas dessas localidades, por exemplo, os territórios indígenas e quilombolas.
O Brasil dispõe de 8.516.000 km² de extensão territorial, sendo que 18% dessa área são unidades de conservação, tendo aproximadamente 1,6 milhões de km². O número de unidades de conservação nos biomas brasileiros não é homogêneo, segundo o Factsheet 2019 da WWF, a Amazônia é o bioma que reveste a maior porcentagem (28%) de UCs no país e o Pampa a menor (3%). Saindo da zona terrestre, nosso país também garante 963 mil km² de conservação marinha, sendo 22,9% em Áreas de Proteção Ambiental. No total, existem mais de 2.300 unidades de conservação realizando o trabalho de preservação do patrimônio biológico no Brasil.
Unidades de Conservação (Integral e de Uso Sustentável)
As unidades de conservação são divididas em dois grupos, que atendem objetivos e tipos de uso diferentes: Proteção Integral e Uso Sustentável. As Unidades de Proteção Integral têm como finalidade preservar a natureza, admitindo apenas o uso indireto dos seus recursos naturais, ou seja, são áreas que não podem ser habitadas e que não envolvem consumo ou dano de sua biodiversidade. As Unidades de Proteção Integral são voltadas para pesquisa científica, recreação com a natureza, educação e turismo ecológico. No Brasil, 6% da nossa área são cobertas pelas Unidades de Proteção Integral, sendo elas: Estações Ecológicas (Esec); Reservas Biológicas (Rebio); Parques (nacionais, estaduais e municipais); Monumentos Naturais (Monat) e Refúgios de Vida Silvestre (RVS).
As Unidades de Uso Sustentável permitem a presença humana em áreas protegidas e compatibilizam a conservação da natureza com o uso sustentável de seus recursos. Nesta divisão, ações que envolvem a coleta e o uso da natureza são permitidas, desde que utilizadas de maneira sustentável para manter os processos ambientais renováveis. As Unidades de Uso Sustentável são contemplam 12% do território brasileiro e detém de poucas restrições do uso da terra, sendo permitidas o extrativismo de produtos como açaí e borracha.
Existem sete tipos de unidades de conservação de uso sustentável: Área de Proteção Ambiental (APA); Área de Relevante Interesse Ecológico (ARIE); Florestas Nacionais (Flona); Reserva Extrativista (Resex); Reservas de Fauna (REF); Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) e Reservas Particulares do Patrimônio Cultural (RPPN).
Estação Ecológica Grão-Pará
No território brasileiro, a Estação Ecológica Grão-Pará é a maior unidade de conservação de floresta tropical do mundo. Ocupando uma área de 4,2 milhões de hectares, o Grão-Pará é um pontinho de esperança em meio ao Estado que antes estava no topo do ranking de desmatamento da Amazônia e que agora é liderado pelo Mato Grosso (MT).
O governo do Pará contém em seu espaço sete unidades de conservação estaduais, localizadas ao norte da calha do Rio Amazonas, em sua totalidade, as unidades abrangem 15 milhões de hectares de floresta amazônica, sendo uma área maior que o Estado do Ceará. Das sete unidades de conservação, apenas a Estação Ecológica Grão-Pará e a Reserva Biológica Maicuru se enquadram nas unidades de proteção integral, que permitem apenas o uso indireto de seus recursos naturais e sem nenhuma atividade extrativista.
O Grão-Pará também é responsável por abrigar, aproximadamente, 61 espécies de anfíbios; 150 espécies de répteis; 700 espécies de aves (incluindo espécies migratórias) e 195 espécies de mamíferos. Sendo 14,3% (anfíbios) e 54,1% (aves) de todas as espécies encontradas na Amazônia, isso configura a Estação Ecológica Grão-Pará como uma das maiores unidades de conservação da biodiversidade e do desenvolvimento sustentável brasileiro.
Unidas de conservação na região
No Estado de São Paulo, o Jardim Botânico e o Parque Zoológico Municipal de Bauru realizam um importante trabalho de conservação, pesquisa e conscientização da população local acerca da necessidade de cuidado com as espécies em risco. Em entrevista, a bióloga Dr. Viviane C. de Oliveira, chefe do departamento de botânica, disse que o Jardim Botânico realiza, atualmente, duas ações voltadas exclusivamente para a conservação da flora.
“Além da manutenção da nossa reserva e das coleções de plantas vivas, temos também dois projetos especificamente voltados à conservação da flora em andamento. Um deles é chamado de “Floresta Solidária” em que selecionamos áreas e procuramos parceiros com propriedades particulares que possuam remanescentes florestais e que permitam o acesso e coleta de sementes pela nossa equipe. Uma parte das sementes coletadas vão para a produção de mudas utilizadas em projetos de restauração e enriquecimento de fragmentos vegetais remanescentes de Bauru e região; outra parte enriquece o Banco de Sementes do JBMB, que é como uma reserva de sementes disponíveis para nossa produção ou de instituições congêneres. Outro projeto é chamado de “De volta pra casa” onde coletamos sementes de 9 espécies que selecionamos (espécies ameaçadas de extinção, raras ou de interesse ecológico), produzimos as mudas e fazemos os plantios em nosso arboreto e em áreas protegidas. O diferencial desse projeto é que estamos tentando garantir um banco genético destas espécies, por isso é necessário ter coletas em vários locais e um número significativo de plantas por espécie”, destacou Viviane.
Além disso, a bióloga afirmou que o Jardim mantém, atualmente, 8 espécies de plantas ameaçadas de extinção em sua coleção. Segundo ela, a lista de espécies com risco de extinção mais aumenta do que diminui. “Temos atualmente 8 espécies de plantas ameaçadas de extinção mantidas em nossa coleção, são 198 acessos mantidos nos viveiros e no arboreto na área de visitação pública. Para citar algumas espécies de árvores, temos o pau-brasil, araucária, cedro-rosa, ipê-tabaco, palmeira-jussara. São espécies consideradas ameaçadas pela Lista Brasileira da Flora Ameaçada de Extinção”. “Infelizmente a lista mais aumenta do que diminui, por isso é muito importante termos as espécies ameaçadas ao menos preservadas em coleções botânicas”, completou.
Ações Diplomáticas
As unidades de conservação prestam um papel importante não apenas na preservação da biodiversidade e na manutenção de seu equilíbrio, mas também garantem uma parcela do desenvolvimento de um país. Se direcionadas em planejamentos setoriais, elas dinamizam a economia, promovem novos empregos, e garantem uma produção agrícola sustentável e uma melhor qualidade de vida nos centros. Entretanto, para que isso aconteça, o Brasil precisa investir ainda mais nas unidades de conservação como um todo.
De acordo com a Constituição brasileira, o poder público tem como dever proteger as áreas de valor ecológico no território nacional. Além disso, as convenções das Nações Unidas sobre Diversidade Biológica (CDB) e do Clima, também são comprometidas na realização da manutenção e na elaboração de novas unidades de conservação, com objetivo de prevenir a deterioração da biodiversidade e a intensificação do aquecimento global.
A CDB está estruturada e ligada com a biodiversidade em três pilares principais: ecossistemas, espécies e recursos genéticos. A Convenção impulsiona tudo que está relacionado de maneira direta ou indiretamente à biodiversidade, como a conservação da diversidade biológica, o uso sustentável da biodiversidade e a repartição justa e equitativa dos benefícios provenientes da utilização de recursos genéticos. O principal foco de implementação da CDB no Brasil está voltado para o Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA).
As Nações Unidas sobre Diversidade Biológica também têm como compromisso proteger ao menos 30% da Amazônia e 17% dos demais biomas brasileiros e 10% das áreas marinhas costeiras. A Convenção também reconhece a importância das áreas protegidas e o seu trabalho na diminuição dos efeitos causados pelos gases do efeito estufa na atmosfera. Fora as metas desenvolvidas pela CDB, a ONU também lançou uma série de Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) para 2030. Entre as 17 ODS, as de número 14 (Vida na Água) e 15 (Vida Terrestre), são pensadas diretamente na conservação e proteção de ecossistemas terrestres e marinhos, sendo fundamentais para que as pessoas desfrutem das melhores condições de vida no planeta.