Entenda a crise dos gafanhotos no Brasil e no mundo

Juntos em nuvens gigantescas, esses insetos vêm acabando com colheitas pelo mundo todo

Nuvem de gafanhotos no Quênia. Foto: Ben Curtis/AP

Por: Gabriel Barbosa

Por cerca de três meses o Paraguai, a Argentina e o Brasil vêm sofrendo com uma praga. Capaz de destruir diversas plantações, nuvens de gafanhotos migratórios se alimentam de matéria vegetal por onde passam.

Segundo Kátia Matiotti, Entomóloga da PUC-SP, uma nuvem pode conter aproximadamente 40 milhões de gafanhotos por quilômetro quadrado de extensão. Com um clima favorável para locomoção, um bando pode se locomover por mais de 100 km em um único dia e acabar com a produção de diversas fazendas.

O estrago que as nuvens fazem se dá pela união do número de gafanhotos, com a quantidade de alimento que eles podem consumir. Algumas espécies se alimentam do equivalente ao seu peso por dia como mostra a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura, sigla do inglês Food and Agriculture Organization (FAO).

Consumo de alimentos de uma nuvem de gafanhotos. Crédito: FAO

Além do claro prejuízo a agropecuária dos países por onde passam, as nuvens também afetam a pecuária ao acabar com os pastos destinados a animais criados para abate.

Os bandos de gafanhotos, porém, tem uma dependência de climas favoráveis para se manterem em movimento. Sergio Antonio de Bortoli Entomologista e professor da Unesp de Jaboticabal, explica que os animais seguem a direção dos ventos e optam por lugares quentes, já que no frio tendem a ficar parados.

Essa dependência foi o que os manteve afastados do Brasil, Sergio complementa “A chegada de uma frente fria aos locais ameaçados mudou a direção dos ventos e o bando mudou de caminho”.

Além disso, o Serviço Nacional de Saúde e qualidade Agroalimentar da Argentina (SENASA) afirmou ter exterminado 85% das nuvens que estavam próximas ao território brasileiro no começo de agosto. Com a chegada do frio nas regiões mais afetadas a organização espera acabar com os bandos restantes.

Mas, o das nuvens de gafanhotos não significa o fim do problema. Especialistas como o coordenador do curso de Ciências Biológicas da FMU, Allan Pscheidt afirmam que as ações do homem contribuem para que essa praga volte a acontecer com mais frequência.

Dois fatores segundo Allan são os principais: o uso de agrotóxicos muito comum nas monoculturas e o aquecimento global. Esses fatores levam respectivamente a uma redução do número de predadores dos gafanhotos e a mudanças nos ciclos ecológicos, aumentando, por exemplo, o período de seca propício para a movimentação dos insetos.

Se o controle populacional dos insetos não fosse prejudicado pela ação humana a ocorrência das nuvens seria menos frequente. O estudo de um grupo de pesquisa do Instituto de Zoologia da Academia Chinesa de Ciências explica, uma vez que conseguiu identificar a molécula que faz os gafanhotos se juntarem em bandos.

O 4VA (4- vinilanisol) é uma molécula que atrai e incentiva os gafanhotos a ficarem juntos, formando as “nuvens”. No entanto, essa molécula é produzida quando os insetos se encontram próximos, logo, se sua população cresce sem controle, a produção de 4VA aumenta, atraindo ainda mais deles em um efeito de bola de neve.

O aumento da quantidade de nuvens não preocupa apenas pelo alimento consumido pelos bandos, mas também pela difícil tarefa que é acabar com eles. Existem poucas maneiras de se resolver esse tipo de praga e algumas delas acabam afetando o ser humano.

Sergio de Bortoli explica que agrotóxicos são muitas vezes usados para combater as nuvens. Porém, por conta da extensão delas e sua rápida movimentação, centenas de quilômetros de terra acabam envenenados também, afetando o solo, a produção de fazendas e até mesmo os lençóis freáticos.

No entanto, existem alternativas ao uso de agrotóxicos. Em fevereiro deste ano, a China se preparou para combater uma onda de nuvens vindas de países vizinhos usando um predador natural dos gafanhotos, os patos. Foram cerca de 100 mil patos soltos na fronteira com o Paquistão (principal fonte das nuvens na época).

Patos usados na China para combate aos gafanhotos. Foto: Estadão

Outra alternativa foi proposta pelo Geógrafo Frithjof Voss em 1996. Segundo ele, utilizando imagens de satélite é possível identificar e dispersar bandos em formação antes que se tornem nuvens quilométricas. Hoje em dia são utilizados drones para realizar essa tarefa que é mais econômica e simples que as demais alternativas.

Apesar dos problemas causados pelos gafanhotos, é importante realizar seu controle populacional com cuidado, já que eles são essenciais na cadeia alimentar transferindo a energia produzida pelas plantas para seus predadores, como lembrou Sergio de Bortoli.

Edição: Nayara Delle Dono

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